segunda-feira, 18 de junho de 2012

Se te ajudar a subir, o papel de "escada" me cai bem.

  O celular toca e interrompe a minha "resolução do dia", não que o momento seja inapropriado, nem estava assim ocupada com grandes trabalhos. Era mais uma daquelas atividades "desimportantes" adiadas sucessivamente, e que agora me sentia aliviada por poder cumprí-la. Olho no visor do celular, reconheço o contato, a conversa não vai ser breve, nunca é. A amiga é dessas que para dizer um simples "sim" ou "não" usa pelo menos mais 300 palavras "complementares". Mas, a adoro e por ela adio mais uma vez o trabalho comezinho.

  E por estarmos há certo tempo sem nos falarmos, iniciamos a conversa nos atualizando, fazendo aquelas perguntas mais superficiais, para só então, iniciarmos a "sessão". Conheço a amiga e logo percebo que será um daqueles diálogos-monólogos; ela fala e eu escuto. Longe de casa, da família, dos amigos mais antigos e até mais próximos (porque até somos bastante amigas, mas nunca dividimos muita intimidade, entende? Mas em determinado setor, nós nos "recorremos". Sentimo-nos seguras em ouvir a opinião "alheia". Eu a dela, ela a minha.) e logo percebo que hoje é a vez dela, de recorrer aos ouvidos daqui.

  Engraçado como nossos diálogos se desenvolvem, ela sempre sabe o que quer, eu não preciso aconselhá-la coisa nenhuma, ela não precisa de opinião alguma; daqui, sigo concordando, sem quase nunca interrompê-la, ela tem uma linha de raciocínio reta, sem interrupções, analisada e, possivelmente, bastante discutida internamente. Percebo que o meu papel é ouví-la e, eventualmente, fazer alguma intervenção, do tipo "entendo", "Aham", "sei", só para que ela saiba que eu continuo em sua companhia. Tal qual uma sessão com o analista, enquanto discorre sobre os últimos acontecimentos, as mais recentes decisões e até suas dúvidas, ela mesma encontra suas respostas. Faço uma ou outra pergunta, só para que ela verbalize a resolução, já internamente definida.

  Enquanto a amiga "desenrola" o seu emaranhado de questões, me abstraio, brevemente, dos detalhes da sua narrativa e penso que a necessidade de alguém que nos ouça é a medida da nossa própria compreensão. Ser ouvido nos permite "dar voz" às questões mais internalizadas. A verdade, é que está mesmo sempre em nós a resposta que acreditamos estar fora ou muito distante. Geralmente, ouvir nossa voz interior não costuma ser o bastante. É preciso verbalizá-la, dar certa "concretude" à abstração dos sentimentos; muitas vezes, falar mais alto, gritar para alguém, para que nós mesmos tenhamos consciência da nossa própria voz. É como se um pensamento fosse um boomerang pesado e confuso em nossas mãos, mas ao soltarmos (falarmos), ainda que desajeitadamente, damos a possibilidade de que ao retornar, ele venha simples, colorido e muito mais leve.

  A amiga estava sim a um passo do "entendimento" da tal questão, faltava-lhe uma "mãozinha" para o término da sua escalada, dei-lhe meus ombros e ela subiu. Lá do alto, não precisou mais gritar, agora estava perfeitamente claro, para ela, quem era, o que dizia e como era a sua voz. Grata, deu-me um sorriso e seguiu o caminho a que estava destinada (?). 

  Cansada, quase afônica, antes de desligar o telefone, a amiga me disse: - Obrigada pela "consultoria" (eu substituiria por "sessão"), você sempre me ajudando a resolver meus problemas. Obrigada mesmo. 
Com o trabalho mais uma vez adiado, as orelhas vermelhíssimas, mas feliz, respondo: - De nada, amiga. Agradeça às promoções dos planos telefônicos . Fosse há alguns anos atrás a "consultoria" lhe sairia demasiado cara.  Ela riu e foi-se embora mais leve, mais bem resolvida, imagino.

  Quem conquista a amizade de um bom ouvinte (a modéstia fica de fora), adia a necessidade de um analista (profissional), enquanto isso vou "quebrando o galho" de escadinha. Acho que alguém dormiu mais tranquila e esperançosa aquela noite. De certo, que não fui eu. Mas a satisfação do "obrigada" ninguém me tira. Ah não tira não...



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