quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Só cinco minutos

  Foi este o tempo que o personagem de José de Alencar precisou se atrasar para conhecer o seu grande amor em uma viagem de bonde. E se não tivesse atrasado, teria amor? Teria o romance ("Cinco minutos") de Alencar? Lembro do livro enquanto ouço o homem entrando no elevador : - Amor, chego aí em  cinco minutos. Eu desci, segurei a porta para ele e ele entrou, logo depois da frase. - Eu segurei a porta para o amor entrar, eu facilitei um encontro apaixonado. Penso consolada.

  Pensei nas inúmeras possibilidades que cinco minutos poderíam determinar. Uma vida inteira poderia ser modificada com os tais minutos. Em breve o homem estaria cara a cara com o ser amado, enquanto neste mesmo tempo eu limitaria-me a tirar o casaco, os sapatos e estaria de pé em frente ao meu mat, para mais uma aula de yoga. Isto era tudo o que eu tinha: um casaco dobrado em cima de uma maca e um par de sapatos debaixo do mesmo móvel. - O homem tinha mais. Pensei. 

  Durante a aula um número me persegue "cinco", o tempo corre atrás de mim e subitamente berra: - cinco minutos. Antes mesmo de começar a minha sequência de posturas e respirações, alguém respirava mais profundo, suspirava, sentia-se pleno, bonito, apaixonado e completo; que fosse por cinco, dez, um minuto, um casal na cidade era incrivelmente feliz. E quantos mais? Em cinco minutos alguém assinava um compromisso (matrimonial, profissional), vendia uma propriedade de família, construída durante cinco décadas; desmanchava um compromisso, quebrava uma promessa, estraçalhava um coração; o sujeito tão pequenino e disforme, se transformava em um bebê lindo acolhido por uma calorosa mãe; alguém morria, deixava para trás um futuro, familiares chorosos e muitas memórias; um homem pulava do alto de um prédio; uma criança tinha seu sonho infantil realizado em sua primeira volta de bicicleta; alguém dizia "eu te amo", um outro "esqueça-me"; em algum lugar alguém tinha uma lembrança feliz e um outro alguém relatava algum trauma antigo para o seu analista. Cinco minutos, trasformam a vida de alguém.

  Às vezes nos preparamos por décadas para um encontro, uma revelação, uma revolução extraordinária, mas em cinco minutos perde-se tudo. A resposta é errada, o sentimento não é correspondido, o automóvel atrasa, você se adianta. Que belo brincalhão é o destino, encaixando peças, separando outras. No fim, penso agora resignada, talvez o esforço nosso de cada dia, só valha mesmo para nos ocupar, nos alimentar de esperanças infrutíferas. Porque é possível que os cinco minutos trasformadores sejam responsabilidade de alguém ou alguma coisa, cuja vontade é soberana. De qualquer modo, o que eu puder fazer para que os meus cinco minutos sejam os melhores do mundo, eu farei. Mesmo que sejam gastos com o ócio (ou yoga), se forem prazerosos, que sejam!