sábado, 1 de dezembro de 2012

Vem ver o céu

  É que ando mesmo com mania de céu, reparou como todos os dias ele está completamente diferente? O de hoje não se parece com o de ontem, o de amanhã será outro, diferente, mas igualmente bonito, entende? Eu não era assim, também mudei. Tenho um primo e uma amiga que são aficcionados pela lua e vez ou outra convidavam-me a contemplá-la. "Sim está de fato belíssima", eu respondia, achava, mas não sentia, pelo menos não como eles, sabe? Achava-a bonita, mas era beleza de não tocar-me tanto. Hoje eu olho a lua e vejo os dois, ora um, ora outro. A lua deixou de ser só um satélite e virou saudade, lembrança boa. É isto que as pessoas fazem, dão significado eterno para uma coisa que você nunca tinha reparado. Uma música, uma cor, um autor, uma frase, uma pintura, um escritor, um filme, deixam de ser a coisa e se personificam, são tanta gente de repente.

  Quanto ao céu, sei bem quando enamorei-me por ele, foi em uma curta temporada de convalescência, curta e ao mesmo tempo tão longa. Com a despedida das visitas e o descanso da companhia, ficava eu solitária em um quarto todo branco, sendo interrompida nas minhas questões apenas pelos cuidados das enfermeiras e uma visita diária do médico. Kafka ficava na cabeceira, lia uma ou duas frases e desistia da leitura, tinha um céu imenso, que dia após dia, eu contemplava cada vez mais. O céu era a companhia verdadeira, leal e constante; não sufocava-me de cuidados, não chateava-me com perguntas, estava sempre disponível e completamente solícito. Azul e branco, anunciando os dias quentes de verão nas ruas, já no meu claustro, pelo menos, a temperatura era amena.

  Depois disto o céu para mim nunca foi o mesmo, tornei-me amiga íntima, entrou para a família, passei a frenquentá-lo como nunca antes e as lembranças, jamais foram dolorosas, pelo contrário, de quando em quando, se o mundo daqui desaba, nele encontro consolo. Então, ontem quando a mãe disse que do meu quarto fazia um céu lindo à noite, interrompi o filme e fui conferir. Estava ondulado, como ondas do mar mesmo, e a lua nele fazia ainda mais sentido, completava o quadro com perfeição. De fato era lindo, inédito e só podia ser visto tão bonito da minha janela. Achei que era um presente e não voltei ao filme. A visita de um amigo tão querido é sempre motivo de festa. Não dispense um convite aparentemente prosaico, vá ver a lua e, depois, prolongue um pouco o olhar e veja o céu, espero que se alguma lembrança se achegar seja tão bonita e restauradora quanto a que trago eu aqui.



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