terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Muito bem acompanhado, embora só

  Já tinha assistido ao filme, agora comia uma comida japonesa, eu e a minha dupla. Lembrava de quantas vezes havia frequentado o mesmo cinema, em outras tantas companhias, outras vezes só. E,  quando estou desacompanhada, nessas ocasiões, jamais sinto-me desamparada. Acho mesmo que a vida requisita que nós saibamos satisfazer um desejo nosso, sem a dependência de um outro qualquer. No entanto, comer, sempre pareceu-me algo muito social, sozinha, como em casa, no máximo, peço algo para comer em casa. Acostumei-me a dividir a mesa, a compartilhar o alimento e a degustar as palavras dos outros.

  Agora, estava um menino, cerca de 14, 15 ou 16 anos, moreno, em um tipo meio indiano, bem vestido, sozinho em sua mesa, vizinho a nossa, se deliciando com os seus sushis, sashimis e uma lata de coca-cola, estava sozinho, mas não parecia solitário. Bonito, sem exibicionismo algum, desses de beleza casual. Satisfeito, mas não eufórico, como os adolescentes desta idade, outros tantos, que andavam em grupos, pelo mesmo ambiente; e por estar sozinho achei-o especial. Nesta idade, eles se "escondem" atrás de amigos, conhecidos e gente que um dia perceberão que não tem nada a ver com eles. Acho que só conhecemos mesmo as pessoas, quando elas estão desacompanhadas. Suas palavras são mesmo suas, seus gestos não são censurados, suas opiniões e posturas nascem delas mesmas sem a "colaboração", tantas vezes, invasiva da pessoa ao lado, sem a necessidade de agradar o tempo todo a sua companhia. E o adolescente, sem nome, estava sozinho, despreocupado, só sendo o que é, sem os gracejos para os amigos, sem os gritos adolescentes, em um sábado à noite, comendo sushi, bebendo Coca, com a praça de alimentação abarrotada, de grupos, duplas ou casais. 

  Enquanto eu e a amiga o observávamos, porque ela também teve sua atenção voltada para a mesa dele, lembrei-lhe da história de uma conhecida em comum, que após dois meses de casamento brigava com o marido ao telefone, por ele não ter tempo para jantar com ela, desconsolada ela choramingava: - E eu, sentada lá, parecendo uma avulsa! Desligou o telefone e como se eu fosse sua amiga, desabafou: - Caso, e não tenho com quem jantar. Rimos da história, eu e a amiga. Acho que para não suportar a própria companhia o indivíduo deve ser mesmo um chato e ela era, como diz a minha mãe, uma "chata de galochas". 

  E, como nada nesta vida está "avulso", diferente da inconsolável recém casada, porque tudo está profundamente ligado. Um dos personagens do filme, daquele que acabara de assistir, um boa comédia romântica francesa, o mais cético de todos, em determinado momento da película pergunta para protagonista, por que é que ela deseja tanto casar. Irônica, sem uma resposta melhor, ela diz que é para nunca mais voltar de táxi para casa. Victor, o tal personagem, diz a Alice, a protagonista, que as pessoas casam-se, na verdade, para evitar a solidão e se frustram quando percebem que estamos fadados a uma solidão eterna, sem remédio.

  A declaração de Victor é acertada, pelo menos, para esta história que eu acabava de lembrar. Para a chata de galochas, casamento era a garantia de uma companhia para jantar e, não foi! Como as amizades, os colegas de trabalho, de faculdade, a família, os filhos, o trabalho, os amores e amantes, nada nos afasta eternamente da sensação de solidão. Sozinhos ou acompanhados, em algum momento a solidão poderá tomar-nos a alma, tal qual uma sombra maligna. Porque qualquer um de nós, possui um lugar cujo único habitante somos nós mesmos, ninguém visita, ninguém encontra o caminho certo para nos acompanhar. Todos nós em algum momento, sentiremos algum tipo de solidão, acompanhados ou sós.

  Para o adolescente bonito, no shopping, a falta de companhia não o tornará solitário, não o matará de fome, tédio, frustração ou recolhimento eterno; e por isso,  acho-o maduro, certo, preparado para a vida. E embora eu, ele e todos nós, um dia, conheceremos a solidão, acho que alguns saberão lidar melhor com ela, se já admitirmos que ela também é inerente à vida. A partir de hoje, comerei sozinha em público e nem por isso sentirei-me solitária, terei os mesmos olhos do menino, cheios de si mesmo. Admite-se companhia, só as boas, eu mesma inclusive.




4 comentários:

Anônimo disse...

rolou identificaçao>> "Porque qualquer um de nós, possui um lugar cujo único habitante somos nós mesmos, ninguém visita, ninguém encontra o caminho certo para nos acompanhar. Todos nós em algum momento, sentiremos algum tipo de solidão, acompanhados ou sós."- Bel

Amanda Machado disse...

E não é? Enfim, esta é a vida de todos nós. Ou aprende-se a admití-la do jeito que é ou dá-se muitas "cabeçadas" tentando modificá-la. Beijos. ; )

Ana disse...

Adoro cinema francês, é o meu favorito.
quanto à solidão tens razão, por vezes estamos rodeados de pessoas e sentimo-nos completamente sozinhos. Eu gosto e preciso de momentos só meus, gosto dr estar comigo, sou esquisita. Às vezes gosto de ir ao cinema sozinha, de tomar um café sozinha, deve ser por isso que gosto de trabalhar de noite, às vezes sinto falta de companhia mas quando estou aqui em casa e é barulho por todo o lado e não consigo um momento de solidão sou muito valor à minha solidão, aquela que me permite a minha estabilidade emocional.
beijos

Amanda Machado disse...

Cinema francês é o meu favorito também, Ana. E, também compartilhamos uma outra afinidade: a da introspecção, do silêncio e o gosto pela própria companhia. Só ainda não tive chance de conseguir um trabalho noturno, acho que me sairia bem...rs
Beijos