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Todos nós, em alguma medida, nos escondemos na felicidade imaginada, porque parece não custar nada, não ferir ninguém, não demandar muito esforço, basta fechar os olhos, respirar profundo, silenciar a vida de fora e inventar uma outra dentro; pronto, a vida inventada nos completa. Todos nós, conscientes ou não, já escrevemos alguma vida, algum diálogo, que nunca aconteceu, atribuímos a alguém um sentimento que é só nosso. Vida sonhada pode ser alento, mas vida demasiadamente imaginada é covardia.
Em um período distante, mas nunca esquecido, a moça imobilizada sonhava todas as noites que participava solitária de uma maratona. No sonho, só a avenida e as pernas explorando o caminho, os cabelos presos em um rabo costumeiro, balançava tanto quanto um rabo canino, euforia, felicidade, cansaço bom, de meta superada, paixão na liberdade das pernas. Vez ou outra, acordava suada, o rosto vermelho do esforço e feliz. Felicidade que vencia a dureza e a monotonia do dia; anestesiava dor, aplacava o medo do futuro incerto. E a vida acontecia todas as noites na corrida sonhada.
Passado o período da imobilidade, as corridas inventadas, ganhavam alguma realidade, bem mais difíceis e menos leves das sonhadas. Diferente. A vida de todos os dias não é capaz de alcançar a perfeição daquela que acontece nos sonhos: a palavra ouvida, nunca é aquela imaginada; o vestido confeccionado pelo sonho não tem o mesmo caimento no corpo real; o desempenho do trabalho não é tão brilhante, pelo contrário, é mediano, cumpre-se o papel apenas; correr requisita cérebro, disposição, respiração, músculos treinados e a tenacidade que os sonhos não cobram. Tudo parece menos brilhante, menos fácil, mas é só esta a verdadeira vida.
A noite lá de fora, o cansaço aqui de dentro, e de repente a necessidade do enfrentamento: é só isto: travesseiro e colcha, nada mais do que isso. Nos primeiros minutos, a desilusão pelo sonho destruído, depois o contentamento pelo que se é. Não é tão ruim quanto parece, nem tão bom quanto gostaria que fosse. Mas é isto que se tem: travesseiro e colcha. Esta noite foi isto. E ainda assim a felicidade visitou, agora mais genuina, eu acho. Sonho deve ser escolha, nunca esconderijo.
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