quarta-feira, 2 de outubro de 2013

O que faz um triste?

  Será que contempla a lua, chora por uma única estrela ou derrama lágrimas se o vento faz dançar os seus cabelos, levanta seu lenço do pescoço e dá movimento a sua roupa? Uma pessoa é triste quando se ressente com a despedida alheia na estação ou se sensibiliza com o encontro afetuoso de dois desconhecidos seus no aeroporto? Um triste chora solitário, sem se lembrar do público que o cerca no teatro, pela ária já conhecida, mas especialmente tocante agora? Ou soluça no escuro do cinema, por uma determinada frase que, de repente, acessa sentimentos tão profundos que a torna definitiva, esclarecedora? É triste quem elege uma música nova ou antiga e a repete incansavelmente, até outra ser ouvida e infinitamente também repetida? É triste quem se cala para ouvir alguém, qualquer pessoa ou elege o silêncio como necessidade eventual?

  Uma pessoa que não gosta de ser fotografada, por exemplo, ela tem necessariamente problemas com a autoimagem e por isso, é um triste? Por que nunca pensam na possibilidade da pessoa gostar de desfrutar das coisas a seu tempo, sem necessidade de ser "congelada" em uma imagem, que sempre fica muito aquém do momento; sem perder os segundos com uma pose, com um sorriso ensaiado, que instantaneamente será divulgado nas redes? Não pode-se querer somente para si  e para os seus, estes minutos de paraíso?  Alguém que se deixa ser roubado por uma estória em um livro, submerso em uma outra realidade, gosta menos da vida ou é menos sociável? Quem identifica-se tanto com a personagem inventada (na literatura ou no cinema) a ponto de ter uma empatia com ela como tem com os próprios amigos ou família, gosta menos do humano?

  É triste quem lê uma poesia de Bandeira ou Florbela como se ela já existisse dentro de si e nascesse somente agora durante a sua leitura? E quem sente a melancolia fina pelo passado e saudade daquilo que ainda não foi, um apetite louco por um futuro que parece não chegar e, ao mesmo tempo, o desejo de não desprender-se  nunca de algo do presente - como um senhor de todos os tempos - é um triste?

  E se pelo caminho, repetidas vezes, depositar expectativas altamente otimistas em algo, alguém ou em si próprio, ainda que, mais tarde, a frustração arraste consigo cada boa esperança depositada; o sujeito é definitivamente um triste? Se um cachorro na rua, uma criança de óculos, um casal de adolescentes, um adulto ruborizado ou um idoso ansioso para aprender algo novo fazerem o  coração de uma pessoa querer saltar para fora do corpo, só por existirem, é caso de acharem-no triste?

  Acredito mais na melancolia sincera, do que nos discursos superficiais de autoajuda, que tanta gente tem usado como filosofia sofisticada, verdade absoluta e  que só fazem atrapalhar a vida dos incautos que neles buscam a solução definitiva para seus problemas. Triste mesmo é a invenção desesperada de um ideal de felicidade absurdo, que nos requisita, somente meia alma; alma inteira mesmo, é aquela que nunca é uma; é variável, cambiante, multipolar. Um triste consola-se com tempo, paciência, leitura, com a contemplação distraída de cada coisa. O melhor do triste é que ele aprende a reconhecer seu estado transitório, diferente da infelicidade, essa sim insistente, destruidora, maléfica, que pode habitar mesmo um alegre. A tristeza acaba em si mesma; diferente da infelicidade cujo desejo é levar consigo todos os sorrisos. Um triste não é caso de preocupação, mas contra os infelizes o melhor é sempre rogar por alguma proteção.




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