sábado, 3 de março de 2012

E porque foi o primeiro...

  Tive poucos, muito poucos amigos homens, dos quais pouquíssimos eram heterossexuais. Não foi uma questão de opção, escolha clara, só sei que sempre me identifiquei mais com o feminino no mundo, então a aproximação se dava e os laços se estabeleciam...deve ter sido assim. Fui "menina muito típica": roupas rosas, saias rodadas; brincadeiras com bonecas e fantasias com princesas. E talvez por isso a pouca afinidade com os meninos. 

  A primeira referência masculina que eu tive, depois do meu pai (aliás muitíssimo presente) foi a do meu irmão. Nem o caçula, nem o mais velho, mas o filho do meio (condição essa tão injustiçada! Filho mais velho é o mais responsável, filho mais novo o mimado e o do meio?).  Não sei os outros, mas o desta família aqui é sensacional...

  Quando muito pequena ele era muito cheio de cuidados comigo, muito atento a qualquer movimento da nova integrante da família (o que geraria um enorme ciúme na mais velha para o resto da sua existência - e não há aqui o menor exagero!), depois as dificuldades em se achar algum passatempo que pudéssemos compartilhar: estradinhas de brita e areia (eu e C. buscávamos o material e o "engenheiro" desenvolvia o "projeto"); séries japonesas na TV (que eu só assistia porque tinham as personagens femininas - eu era a rosa e C. era a amarela); jogos da seleção brasileira de futebol; "Caverna do Dragão", "Tartarugas ninjas", "He-Men", "Thundercats", "Trapalhões" e nunca, jamais "Meu querido Pônei" ou "Ursinhos carinhosos". Mais tarde, as brigas diárias, descobri aqui que o afeto também se dava através das provocações, apelidos e críticas.

  Meticuloso, organizado, curioso e com um espírito de colecionador (inventava uma coleção nova todo ano: álbum de figurinhas do "brasileirão", da copa do mundo de futebol, times de botão, letras de músicas dos Engenheiros do Hawaii e as traduzidas do Guns n' Roses tudo "datilografado" na velha máquina do meu pai, bonequinhos do "Comandos em ação", selos...tudo passível de se colecionar ele "investia"). Era também de "fases de descobertas", quando "descobriu" o durepoxi (aquela massinha bicolor para consertar metal, azulejo. Muito usada também por artesãos...) houve uma "explosão" da argamassa em casa, era durepoxi para todo o lado...houve a "fase papel contact", e tudo em casa recebeu uma camada do poderoso papel (mesa, painel da máquina de lavar, espelho do interruptor de luz, além dos cadernos e fichários "personalisados" que ele produzia: minha irmã teve um caderno com o Bon Jovi na capa; teve a temida "fase gravador", em que ele gravava conversas escondido, músicas que tocavam nos programas de rádio e, finalmente, a "fase video cassete" gravava qualquer programa na TV, clipes da MTV e jogos de vôlei de qualquer time, além das suas participações nos telejornais locais, tudo devidamente etiquetado, datado e descrito. Muito talentoso para atividades mais meticulosas, muito hábil para desenho e equações matématicas, letra mais caprichada do que a minha (logo eu que usei o caderno de caligrafia por anos!), mas a habilidade que ele se destacaria e por ela nos afastaríamos seria para o esporte.

  Sempre um apaixonado e muito estimulado  ele correu (e até se perdeu numa maratona de rua), jogou futebol e mais tarde, pelo vôlei mudaria de cidade, depois de estado, mas nunca do meu saudoso coração. Enfrentou as dificuldades da independência precoce, persistiu algum tempo no esporte e abriria mão do seu sonho infantil pela estabilidade e a vida em família, com a qual se acostumara (agora com a sua própria).

  Adulto, profissional, pai (agora de duas meninas! Sim. Ele sabe bem como conviver com o "mundo rosa"...), mais de 15 anos sem a convivência diária, mas porque foi o meu primeiro amigo, porque cresceu, mas ainda é o "mesmo", porque é familiar  e ao mesmo tempo "desconhecido" (há quem acredite que só tenho uma irmã) ele jamais se afastou do meu cotidiano...tudo lembra ele: esporte na TV, filme do Stallone, do schwarzenegger, Didi Mocó, caderno encapado por papel contact, uma caligrafia bonita,  uma música dos Engenheiros do Hawaii... Eu e você, querido "primeiro amigo", com a nossa história, para sempre seguindo nessa "infinita highway..."
            



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