terça-feira, 24 de abril de 2012

Que segredo você guarda?

  E, foi em uma conversa forçada, na tentativa de uma aproximação, que eu repelia com todas as minhas forças, que eu ouvi a pergunta. A orientadora educacional do colégio, por quem eu não tinha nenhuma simpatia, tentou a tal abordagem.

  Eu, adolescente, desprezava o seu tom amigável e quanto mais perguntas ela fazia, mais silenciosa eu permanecia. Segredo? Eu tinha algum? Talvez tivesse, tinha, tenho, mas dividiria com ela, logo com ela? Nunca. Não mesmo.

  Verdade. Eu tinha um segredo. Tinha muitos. Tinha mesmo muitas coisas não compartilhadas. Nasci assim, cresci assim e, arduamente, permaneci e vivo assim: "ensimesmada".
  Mas, o que eu guardava era meu; nada que eu desejasse mesmo "espalhar" e diante da inquisitora antipática eu resolvi fingir um segredo grave, contundente; mas sem emitir muitas palavras, no máximo as duas: "sim" e "não". Eu tinha um desafio. Manter-me calada, sugerir algo que não existia e permanecer ali, na sala, na frente dela, com a postura rebelde (que nunca combinou comigo) até o final.

  Enquanto ela perguntava, eu pensava em muitas coisas, coisas que não revelaria. A angústia seria dela, afinal foi ela quem iniciou o confronto. Lembrava que de secreto, naquela época, só uma caixa de papelão, onde eu guardava minhas "miudezas", coisas que eu via, me emocionava e, claro, que coubessem na caixinha secreta. Eram uns recortes de revistas com as celebridades que eu admirava (sem nenhuma razão específica. A "aura" de celebridade me seduzia) Jackie keneddy, Lady Di, Madonna, Barbra Streisand, Andy Garcia; recortes de vestidos de noiva (que guardava desde criança); um postal com duas crianças africanas em uma praia e um bebê ruivo, os três, meus filhos imaginários, que eu ainda não gerei - embora sonhasse que aos 20 anos todos já fariam parte da minha vida; uma foto de uma sul-africana coberta de farinha de trigo, punição imposta por um policial, depois da menina ser presa, suspeita de roubar em um supermercado; três amostras de perfume, que nunca usei, por causa de uma persistente alergia; fotos 3x4 de pessoas queridas; alguns poemas copiados em pedacinhos de papel, que mais tarde eu decorei (e lembro até hoje, pelo menos parte deles); folderes de uma feira de orquídeas com fotos e seus nomes científicos, ...

  Nenhum dos artigos, da caixa de papel, combinava com a imagem que eu decidira passar. Ria, gargalhava, por dentro. Ela achava que eu tinha motivos para não "estar bem na escola" e eu sabia que não tinha (nenhum outro além de uma "malandragem" eventual); ela via segredo, onde só existia discrição e uma existência pacata.

  Ninguém, que a gente não queira, sabe mesmo o que se passa cá dentro. E, este é dos "poderes", que mais admiro, que mais exercito e do qual não abro mão nunca. Quer ouvir um segredo? Eu engano gentes por aí. E é bom, às vezes...


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