quarta-feira, 5 de junho de 2013

Gente é livro

  E um livro é escrito por quem lê. O leitor é o dono maior da estória. Livros e pessoas são construções negociadas, somos para os outros, tão somente, o que eles podem ver. E por maior que seja o esforço que um escritor empregue em sua obra, o leitor lê aquilo que ele pode, entende e aquilo com o que, eventualmente, ele se identifica.

  Não adianta apontar páginas, destacar trechos, escolher palavras que o leitor desconhece, ele vai apreender o que lhe tocar o coração, vai fixar na memória, o que antes, colar na alma. E assim são as pessoas, o que é o seu melhor para você, pode ser insignificante para o outro, o que é um detalhe, quase desconhecido em sua personalidade, pode ser fundamental para a empatia alheia.

  Juntas, novamente, descemos a rua, ela é a ausência diurna que só deseja compartilhar, mal a escuto e já repreendo seu olhar afetuoso com alguém que já decepcionara-a tanto. Sua capacidade de perdoar e esquecer é admirável, portanto deveria ser valorizada, mas temo essa facilidade de doação, já permitiu-lhe grandes arranhões. Mais tarde arrependo-me, mas é noite e ela dorme antes das minhas desculpas. Na estante os livros quase organizados, por tamanho e forma, me lembram das idealizações desfeitas, das surpresas bem vindas; subestimados antes e grandiosos depois, alguns superestimados na livraria e em casa decepcionantes, nenhum deles é verdadeiramente de todo ruim, talvez a minha leitura tenha sido rasa demais em alguns ou profunda quando não requisitava.

  Livros e pessoas merecem sim uma segunda leitura, uma nova chance sempre, é assim que eu lia, não era? Lia, pelo menos três obras do mesmo autor, até decidir que sua escrita não agradava-me mesmo. O que vai fora do livro, em sua capa, resenha ou crítica não pode definir uma estória. Opiniões desfavoráveis de outros leitores também não deveriam interferir em nossa escolha e julgamento. Os olhos dos outros, são dos outros. Nem mesmo o nosso deveria se repetir. Uma mesma pessoa permite tantos olhares, que a limitação é, no mínimo, injusta. Buscar em um mesmo livro possibilidades diferentes a cada dia é o que torna a estória grandiosa. Um livro nunca vem terminado.

  Ela é que a boa leitora, a esperteza é toda dela. Tolice é achar que somente a partir de uma leitura é possível dizer se é bom ou ruim. Dos livros é possível afastamento, mas com as pessoas a insistência em uma leitura mais generosa é ainda a maior virtude. 



6 comentários:

Anônimo disse...

Gostei, me identifico e assino embaixo Mandinha!!! ;)

Ana disse...

Adorei este texto e a analogia entre pessoas e livros. Tens razão, há escritores que têm livros que não gosto e outros que adoro, o Saramago é um bom exemplo. se me tivesse ficado pela primeira impressão nunca teria lido outros livros dele que são fantásticos. com as pessoas é assim, há que experimentar mais do que uma leitura, até porque todos temos dias em que nem de nós gostamos!
beijinhos

Amanda Machado disse...

Rs ;)

Amanda Machado disse...

Ainda bem que insistiu com Saramago,Ana, o homem é mesmo incrível! Já na primeira leitura me arrebatou. Beijo

Anônimo disse...

Incrível seu texto! Inda agora, antes de abrir o blog, estava pensando em julgar mal alguém pelos seus atos, mas então pensei: pq não mudo eu, o foco do meu olhar para os atos dele? E vem vc e me diz para ler as pessoas de um modo diferente... Não poderia ser mais harmônico.

Parabéns pelo texto.
Continue, continue!

Beijos.

Amanda Machado disse...

Obrigada Zi! Que bom que de alguma maneira o texto te inspirou, ou melhor, a sua leitura dele...beijos. ;)