sábado, 8 de fevereiro de 2014

Que nunca se complete

  Reconhecer o tamanho da nossa ignorância é sabedoria; admitir a nossa desimportância é atitude das mais nobres; perceber que ainda "falta tanto" é querer crescer. Quem nasce completo, desconhece a riqueza da descoberta. Não falo do complexo rodriguiano do "vira-lata", de sentir-se menos inteligente, bonito, generoso ou rico em relação ao vizinho, mas ao contrário, saber que todos nós, em alguma medida, estamos sempre em falta. A pior janela que podemos escolher é do "isso em nada me acrescenta". Tudo, absolutamente, nós acrescenta, se deixarmos.

  Engraçado como à medida que crescemos, nos afastamos cada vez mais dessa permissão, disponibilidade natural de aprendizado, quanto mais próximos da infância, menos nos envergonhamos pelo que não sabemos. Mesmo uma criança muito tímida, se envergonha de perguntar, mas não do fato de não saber. Não saber e admitir é magnânimo; é uma generosidade com própria condição. "- Não sei, mas quero aprender". Eu gosto de quem não sabe e não se esconde, eu quase sempre, amo muito mais quem não se ruboriza diante de um impasse. Os amores da minha vida, meus amigos, meus ídolos, nunca souberam de tudo e sempre me pareceram maiores por isso.

  A colcha azul sobre a cama, o sol terrivelmente bonito lá fora, o reflexo rosa do prédio do final rua, invadindo o  quarto de parede lilás e a resposta para um e-mail com um pedido de desculpas, escrito há mais de um mês: "Claro, qualquer um pode errar". Acho que significa que fui perdoada. Mas o sentimento da  absolvição já habitava-me desde o pedido, quase sempre, nós é que somos responsáveis por seguirmos ou abandonarmos a culpa. É óbvio que não erramos sozinhos, mas cabe a cada um a admissão da sua própria falha. E lembro do vídeo recente assistido exaustivamente: "em caso de emergência salve-se primeiro!". A insistência infértil de salvarmos os outros, resolvermos os problemas deles, apontarmos suas falhas e nós, estamos a salvo? Nunca.

  Resolução para a próxima hora: salvar-me primeiro.

  Ontem o dia foi estranho, permeado dessas dúvidas sutis e certezas quase doloridas, as evidências são mais desconfortáveis que a desconfiança e isso, quase nunca admitimos. Ontem o dia foi doce e cheio de gratidão, por  ter o saber mais bonito que alguém pode possuir: o saber incompleto. Desligo o computador, não aguardo e-mails generosos, não aguardo e-mails, não aguardo, não.



Nenhum comentário: